Prosa: Um em um milhão

Este texto foi escrito há uns tempos e baseia-se numa história de amor não correspondida de uma amiga minha que gosta de um rapaz desde sempre. Apesar de se terem encontrado por breves instantes na estação de comboios da localidade onde eles vivem, conseguiu perceber que algo nele mudara. Ela nunca lhe disse que gostava dele e acha que nunca lhe chegará a dizer pois eles agora estudam em cidades diferentes, e ela sabe que ele já viveu, viu e experienciou muitas coisas e por isso mesmo talvez já não olhe para as coisas do passado como antes. Visto que ele já viu mais e melhor não quererá de certo voltar para trás, para ela.
É uma pena ela nunca ter-lhe dito que o amava, quem sabe se não teria mesmo nascido uma linha história de amor?

          O rapaz que eu conheci há uns anos atrás transformou-se num homem. Mais maduro, mais responsável, mais ativo. No entanto, o que não mudou, e penso que nunca mudará, é a profundidade dos seus olhos. Como dois poços infinitamente fundos eu perco-me neles. Universos com mil e uma galáxias e milhões de planetas ainda inexplorados.
          Cada vez que desvio o olhar e volto a focar nele é como se não existisse mais nada à volta. O tempo pára. Ele fala e isso faz-me sair do transe. Mas não por muito tempo porque os olhos dele chamam-me como uma flauta mágica. Túneis sem fim. Trilhos novos para serem descobertos. Prados imensos a perderem-se no horizonte. Há um mundo inteiro dentro dele, um mundo cheio de vida mas também de serenidade a chamar por mim.
          Ele volta a falar e obrigo-me a sair desta realidade paralela que nunca irá acontecer. Ele vai-se embora outra vez e eu também. É a nossa vida agora, por enquanto. Estudamos um em cada lado mas enquanto eu não vou para muito longe daqui, ele segue para uma das cidades mais movimentadas do país.
          Imagino-o no meio daquele mar de gente. Pessoas de diferentes raças e etnias; cada um com a sua história de vida, angústias e sucessos; pessoas que já vivenciaram episódios de imensa dor mas também de felicidade extrema, os que estão agora na plena juventude como ele.
          E pergunto-me se eles veem o mesmo que eu vejo quando olham para ele.

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